Tem aquele ditado...
Então...
Dizem que quando uma mulher quer alguma coisa, quando uma
mulher encasqueta com algo, não tem ninguém nesse mundo que segure. O ditado é
machista, mas tem sentido: água morro abaixo, fogo morro acima e mulher quando
quer dar não tem o que segure. Mas homem também não fica atrás.
Leni é uma mulher jovem, bonita e com a sensualidade de seus
28 anos explodindo. Casada por conveniência, casamento arranjado pelos pais que
conseguiram se livrar de uma divida e ainda de bônus uma casa na cidade, ela
vivia com um fazendeiro muito rico, mas um porco chauvinista que morria de
ciúmes de Leni, pois ela era a sua maior conquista, dando um certos status ao
velho fazendeiro, passear com uma bela formosa pelas ruas da cidade.
Seu Valentino, o velho fazendeiro, gostava muito de uma
cachaça, jogar baralho no bar da esquina da Igreja, contar vantagem de quanto
estava indo bem a sua fazenda e passar suas horas no puteiro da cidade onde ele
já era sócio.
Mas como todo ciumento neurótico, ficava louco com qualquer conversa
sobre sua linda esposa, qualquer comentário sobre sua esposa, era motivo de
encrenca, que ele resolvia colocando seu capataz Juvenal pra dar um jeito no
peão abusado.
Pra garantir a rotina abstinente de sua esposa, Valentino
colocou Juvenal na cola da Leni o dia todo. Mas seguia a distancia, como um
guarda-costas, meio vigilante, meio espião. Ele tinha que vigiar, não precisava
ficar junto da jovem porque o velho fazendeiro também não confiava em Juvenal,
já que o mesmo tinha uma péssima fama de arrasar as cabritas da cidade. Comprou
uma moto, artigo de luxo naqueles confins do Nordeste, somente para que Juvenal
vigiasse a menina dia e noite. Isso porque ela só ia para igreja aos domingos
terças e quintas e para a casa de sua mãe nos sábados quartas e sextas. As
sextas, de vez enquanto ficava muito tarde e como a cidade não tinha iluminação,
ela dormia na casa de sua mãe, já que seu marido passava a noite na companhia
das garotas do bordel da cidade.
O tempo foi passando e um dia na missa, aparece um rapaz
muito bem apessoado, jeito de galanteador que é percebido por Leni. Uma amiga
carole informa que o nome dele é Getúlio. Mas quando ela pensou em dar uma olha
para Getúlio, o rapaz já estava babando para ela, jogando todo charme que
tinha, pra conquistar a bela moça.
Leni não era de perder missa, agora então, não faltava a
uma, no domingo, terças e quintas, lá estava ela cada vez mais bem vestida e
arrumada para ver Getúlio que não economizava nos olhares para a moça. Apesar
de ter sido avisado de forma clara, a situação dela, de mulher casada mas
infeliz, e que o marido era extremamente bravo.
Mas sabe aquelas coisas que você não tem como explicar? Você
vê uma pessoa e acende uma luz, dispara um alarme. Getúlio não levava em conta
as ameaças que o povo impetrou quando contaram da situação da moça, e o que
podia acontecer com quem aproximasse dela. Como por exemplo, com Toninho da
Lola, um jovem rapaz que era apaixonado por Leni desde criança e que quando
soube que ela iria se casar obrigada, tentou roubar a menina e fugir para
outras terras.
Diz a lenda que Juvenal pegou Toninho no bar, bateu nele,
arrastou com o cavalo pelas ruas da cidade, depois pisoteou com o animal,
queimou, cortou em pedaços e depois jogou no rio.
A ordem ninguém sabe ao certo, mas foi isso que aconteceu.
E teve o caso de Frederico Medeiros, um advogado que foi
cuidar da papelada da casa que Valentino deu aos pais de Leni, que ficou
abobado com a beleza da moça e jogou seu charme pra cima dela.
O povo lá da fazenda falou que esse cara ficou amarrado num
poste cheio de carne, e que Juvenal soltou os cachorros pra morder o coitado
até ele morrer. Depois pegou ele deu mais uma surra de vara de marmelo,
pendurou de cabeça pra baixo numa arvore e arrancou o couro do homem com ele
ainda gritando. Depois colocou o coro no lugar de novo, queimou, cortou em
pedaços e jogou no rio.
Mas Getúlio estava tão apaixonado que nada disso lhe
colocava medo. Ele só queria um instante com Leni, já que ele tinha certeza que
ela também correspondia ao seu sentimento.
Uma missa, na fila dá benção da hóstia, ele ficou bem atrás
dela e puxou conversa. Claro que Leni lhe deu toda a atenção, estava tão
apaixonada que não tinha como manter a pose de mulher casada.
Enquanto a fila andava vagarosamente ele se revelou e ela
lamentou a sua situação que a impedia de retribuir ao sentimento que ele a
ofertava.
Sempre claro, observando se Juvenal estava percebendo a
conversa, que era mais do tipo falando às paredes, sem que os dois encarassem.
Isso seria suicídio.
Mas funcionou muito bem, ainda mais quando pegavam a fila
bem lá no final, com um monte de gente à frente, já que a igreja era grande e o
pessoal todo ia pegar a hóstia consagrada. Muita gente já havia percebido a
armação do casal, até o padre Bento que quando os dois se aproximavam, separava
a fila para que ela recebesse a hóstia de sua mão e Getúlio de um auxiliar seu.
Aqueles encontros eram demasiadamente esperados por Leni,
que esperava a sequencia da missa, para chegar a hora da hóstia, para a
formação da fila para encontrar o seu amor. Isso já estava uma rotina, até que
Getúlio falou bem sério:
- Vou dar um jeito da gente fugir.
Uma grande mistura de sentimentos inundou o coração de Leni,
medo, paixão, angustia, terror e mais uma dúzia que fizeram com que seus joelhos
enfraquecessem e ela ameaçou cair, mas foi prontamente amparada por Getúlio,
que segurou a moça pelo braço e não a deixou ir ao chão. Aliás, esse foi o
primeiro contato físico entre os dois, o que rendeu outro turbilhão de emoções
na pobre moça.
Mas ai é que a coisa pega, depois da missa, Getúlio tentava
bolar um plano pra conseguir fugir com a moça da cidade, sem acabar queimado
cortado e jogado no rio, já que Juvenal estava sempre na cola e de olho em
Getúlio já fazia uns dias.
Ai então ele bolou o plano perfeito, e nesse plano ele teria
que ficar amigo de Juvenal, que não era de muitos amigos. Mas o charme do rapaz
era bom, boa conversa e mentalidade para criar alguma coisa. Foi então que ele
procurou Juvenal num bar no fim da noite, onde ele costumava beber dar uns
tapas na bunda das meninas que serviam. Era um tipo de bordel, mas ninguém
botava a cara, nem a policia, e numa dessas, ele se aproximou de Juvenal
pagando uma cachaça e passando uma conversa.
- Ouvi falar muito do senhor, dizem que é uma cabra muito
competente, do tipo que não tem meia função.
Juvenal respondeu – Sou mesmo, quem lhe falou não mentiu
não. Comigo falo tá feito, não tem meia boca.
- E o senhor é muito forte, bom de faca.
Juvenal sacou a faca e com movimentos rápidos, estendeu a
mão esquerda na mesa e com a direita cravava a ponta da faca entre os dedos,
rapidamente e sem se machucar, demonstrando sua habilidade.
- Vixi do coitado que tá querendo lhe desbancar, vai morrer “facinho”. – disse Getúlio tomando um
gole.
- Quem é o besta que tá querendo me desbancar? – falou
Juvenal entornando meio copo de cachaça e limpando a boca na manga da camisa.
- O senhor não ouviu essa conversa não? Estão falando que
tem um cabra ai, que falou que o senhor é frouxo e vai roubar a mulher do fazendeiro.
Juvenal levantou-se da mesa abruptamente, jogando a cadeira
para trás e colocou a faca no pescoço de Getúlio – Fala agora o nome desse
falecido.
- Olha – tentando virar a ponta da faca para outro lado –
Isso eu não sei dizer não senhor, mas tá todo mundo falando que ele já marcou o
dia e é na sexta, o dia que ela vai pra casa da mãe dela.
- Isso já ajuda muito. Então nesta sexta ela não sai de
casa. – falou Juvenal decidido.
Percebendo o furo básico de seu plano, ele abraça Juvenal e
tenta aconselhar.
- Não... O senhor não pode fazer isso – percebe que Juvenal
não gosta da aproximação ele retira o braço – O senhor tem que deixar ela ir,
porque se não for nesta sexta, vai ser em outra. O senhor tem é que pegar o
cabra.
- Isso você está certo – responde Juvenal mais pensativo –
Não vai adiantar porque o cabra pode não falar o próximo dia que ele vai
tentar, ai o desgraçado rouba a menina e eu tô lascado.
- A gente tem que armar uma arapuca pra pegar esse safado.
- A gente? – pergunta Juvenal desconfiado.
- A gente – diz Getúlio voltando a abraçar Juvenal – O
senhor é muito conceituado nessas bandas, e meu falecido pai, que Deus o tenha,
falava muito bem do senhor, e eu não quero que um espelho pra mim fique
desmoralizado.
- Espelho? – pergunta Juvenal sem entender?
- Isso mesmo, uma pessoa como o senhor é exemplo para todo
cidadão de bem dessa cidade. A comunidade toda gosta do senhor e não pode ficar
desmoralizada com uma façanha dessas. Escute só, eu tenho um plano.
Getúlio conta seu plano a Juvenal que não gosta muito a
principio, mas depois concorda.
Na quinta, ele novamente a fila da hóstia, enquanto Juvenal
ficou do lado de fora da igreja quase que revistando quem entra. Ninguém
passava por ele sem ser severamente encarado, Getúlio se aproxima de Leni e diz
a ela:
- E amanha que nós vamos fugir.
- Você está louco? Juvenal vai te matar. Ele vai pegar a
gente e te mata.
- Fica tranquila e preparada. Só confia em mim e finja que
nunca me viu na vida.
Na sexta, na hora normal em que Leni ia para a casa de seus
pais, começou a desenrolar o plano de Getúlio. Ele bate na porta dos fundos da
casa dos pais onde Leni já estava pronta, coloca na garupa da moto e pegam a
estrada sem deixar rastro e sem olhar para trás.
Quando passam duas cidades, eles param num hotel e a
curiosidade de Leni não permite mais nada, ela tem que saber como foi que isso
havia acontecido.
Getúlio então conta.
- Eu disse a ele que tinha um cabra que ia roubar você essa
noite. Então me propus a ajudar. Pra pegar o cabra, eu falei pra Juvenal que
ficava com a moto dele e pegava você e lavava a fazenda de seu marido enquanto
Juvenal ficava na frente de sua casa vestido de mulher e seu marido com mais
cinco capangas esperando o cabra chegar pra te buscar, prontos para atirar no
cabra.
- Você é louco!
- Mas funcionou, Juvenal ficou lá na frente, seu marido e
mais cinco capangas prontos e armados esperando o cabra enquanto eu sai pelos
fundos com você na moto dele.
Enquanto isso na frente da casa dos pais de Leni, Juvenal
vestido de mulher grita para o fazendeiro que está escondido:
- Acho que ele não vem hoje não.
Anselmo Duarte